O papel em branco, o vazio. As idéias não vêm, o papel permanece imaculado. Toc, toc, toc. A caneta batucando o papel. Arrisca um rabisco. "Será que ela anda sozinha se eu der um empurrãozinho?" Nada. O rabisco é apenas um rabisco, não se transforma em palavra, não origina uma frase, não pare uma idéia. Tic, tac, tic, tac. Os minutos passam velozes. Olha para seu lado esquerdo, a garota de óculos escreve freneticamente, parece não encontrar qualquer dificuldade. À sua direita o rapaz bonito de olhos azuis preenche a folha, antes virgem, com tranquilidade como se executasse uma música que soubesse de cor, dá até vontade de ficar olhando. Não pode. O tempo passa. Na sua frente, atrás de si, o mundo inteiro parece escrever sem qualquer dificuldade. "Deus, de onde vem as idéias desta gente?! Será que não sobra nenhuma para mim?"
Chacoalha a cabeça para espantar estes pensamentos. Fixa os olhos novamente no papel. "Ok.OK. Basta concentração." Repassa mentalmente as regras dos manuais de redação que leu, os simulados do cursinho. "Basta apresentar a idéia de forma suscinta no primeiro parágrafo, depois desenvolvê-la com coerência por mais dois ou três parágrafos, cuidando para usar argumentos originais, e concluir tudo com clareza e alguma elegância no parágrafo final. Simples. Não dói nada... Droga! Quero construir edifícios, não ganhar o Nobel de literatura, porque raios preciso reinterpretar um poema de Haroldo de Campos?"
Tic, tac, tic, tac. Meia hora já se passou.Começa a suar. Algumas pessoas já se levantam para entregar a prova. A garota de óculos sai da sala com um sorrisinho idiota de quem foi muito bem. Ela se pergunta como é possível odiar uma pessoa que nem conhece. Enxuga a testa com as costas da mão. "Eu sou inteligente. Respondi a prova de exatas em tempo recorde." O garoto bonito de olhos azuis tampa a caneta, confere mais uma vez sua folha e se levanta. Agora já não há mais ninguém à sua direita nem à sua esquerda. Apenas a folha em branco a lhe encarar cada vez mais desafiadora, mais cruel, tão cruel quanto uma folha em branco pode ser.
De repente, a figura da mãe surge em sua mente, o beijo na face naquela manhã. "Com certeza você vai passar filha." Certeza. Também vem fazer companhia à dona Célia em sua cabeça Rodrigo, seu ex-namorado, a lembrança de uma tarde em Floripa. "Gata, esse negócio de faculade é tudo besteira, quanta gente com o diploma pendurado? Vamos abrir o nosso negocinho, trabalho é trabalho, o importante é ser feliz" Negocinho. Existe esta palavra? Pensou.
Ao contrário de Rodrigo, ela achava que só seria feliz construindo edifícios, enormes edifícios, pontes, estradas. Algum problema nisso?
A esta altura, a sala já está praticamente vazia, apenas cinco ou seis anida encaram a temida prova, provavelmente pobres atormentados como ela.
Não há mais tempo. É agora ou nunca. Respira fundo, encara o papel em branco uma última vez. Inicia com uma palavra, esta puxa a seguinte e aí vem outra e mais outra. A folha vai sendo preenchida, ela já não pensa muito. Sente mais. A cada linha parece ficar mais fácil e ela chega ao fim.
Suspira. Vai reler, ver o resultado final. Não dá. O tempo acabou. Tem que entregar a prova.
Calmamente, como em transe, arruma suas coisinhas e sai, já não sua mais frio, é a última a deixar a sala.
Vai construir viadutos ou morar embaixo de um? Quem sabe? Agora só resta esperar. A mãe deve estar aflita em casa.Sai do prédio, a tarde está linda, franze os olhos por causa do sol.
"Moço, me dá um de limão?"
Chacoalha a cabeça para espantar estes pensamentos. Fixa os olhos novamente no papel. "Ok.OK. Basta concentração." Repassa mentalmente as regras dos manuais de redação que leu, os simulados do cursinho. "Basta apresentar a idéia de forma suscinta no primeiro parágrafo, depois desenvolvê-la com coerência por mais dois ou três parágrafos, cuidando para usar argumentos originais, e concluir tudo com clareza e alguma elegância no parágrafo final. Simples. Não dói nada... Droga! Quero construir edifícios, não ganhar o Nobel de literatura, porque raios preciso reinterpretar um poema de Haroldo de Campos?"
Tic, tac, tic, tac. Meia hora já se passou.Começa a suar. Algumas pessoas já se levantam para entregar a prova. A garota de óculos sai da sala com um sorrisinho idiota de quem foi muito bem. Ela se pergunta como é possível odiar uma pessoa que nem conhece. Enxuga a testa com as costas da mão. "Eu sou inteligente. Respondi a prova de exatas em tempo recorde." O garoto bonito de olhos azuis tampa a caneta, confere mais uma vez sua folha e se levanta. Agora já não há mais ninguém à sua direita nem à sua esquerda. Apenas a folha em branco a lhe encarar cada vez mais desafiadora, mais cruel, tão cruel quanto uma folha em branco pode ser.
De repente, a figura da mãe surge em sua mente, o beijo na face naquela manhã. "Com certeza você vai passar filha." Certeza. Também vem fazer companhia à dona Célia em sua cabeça Rodrigo, seu ex-namorado, a lembrança de uma tarde em Floripa. "Gata, esse negócio de faculade é tudo besteira, quanta gente com o diploma pendurado? Vamos abrir o nosso negocinho, trabalho é trabalho, o importante é ser feliz" Negocinho. Existe esta palavra? Pensou.
Ao contrário de Rodrigo, ela achava que só seria feliz construindo edifícios, enormes edifícios, pontes, estradas. Algum problema nisso?
A esta altura, a sala já está praticamente vazia, apenas cinco ou seis anida encaram a temida prova, provavelmente pobres atormentados como ela.
Não há mais tempo. É agora ou nunca. Respira fundo, encara o papel em branco uma última vez. Inicia com uma palavra, esta puxa a seguinte e aí vem outra e mais outra. A folha vai sendo preenchida, ela já não pensa muito. Sente mais. A cada linha parece ficar mais fácil e ela chega ao fim.
Suspira. Vai reler, ver o resultado final. Não dá. O tempo acabou. Tem que entregar a prova.
Calmamente, como em transe, arruma suas coisinhas e sai, já não sua mais frio, é a última a deixar a sala.
Vai construir viadutos ou morar embaixo de um? Quem sabe? Agora só resta esperar. A mãe deve estar aflita em casa.Sai do prédio, a tarde está linda, franze os olhos por causa do sol.
"Moço, me dá um de limão?"
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bjos
Lu